A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou para reconhecer a omissão do Congresso Nacional por não criminalizar a homofobia e determinar que seja aplicada a Lei de Racismo nos casos de discriminação contra LGBTI até que seja editada lei sobre o tema. Nesta quinta-feira, 23, os ministros Rosa Weber e Luiz Fux seguiram os votos de Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Roberto Barroso, formando a corrente majoritária. Ainda faltam cinco votos. O julgamento foi suspenso e será retomado em 5 de junho.

Esta foi a quinta sessão do julgamento conjunto da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26) e do Mandado de Injunção coletivo (MI n. 4733). Pelos votos já proferidos, ainda está em aberto se o Supremo deve fixar prazo para que o Congresso debata sobre uma legislação específica que criminalize a violência contra a comunidade LGBTI. Em seus votos, os ministros ressalvaram que a compreensão de que as práticas homofóbicas configuram racismo social não ofendem a liberdade religiosa, que é consagrada constitucionalmente.

Primeira a votar, Rosa Weber disse que a mora do Congresso em cumprir a determinação constitucional está devidamente demonstrada. Além disso, para ela, o próprio conceito jurídico-constitucional de racismo abarca a discriminação em gênero e orientação sexual.

“O pedido tem lastro no artigo 5º da Constituição, segundo o qual a lei punirá qualquer discriminação atentatória a direitos fundamentais. Entendo que o direito à própria individualidade, identidades sexual e de gênero, é um dos elementos constitutivos da pessoa humana. O descumprimento de tal comando pelo Legislativo, não obstante transcorridas três décadas desde a promulgação da lei fundamental, abre via da ação por omissão, previsto na Constituição e que visa suprir vazio legislativo. No caso, a mora do poder legislativo em cumprir determinação imposta pelo artigo 5º está devidamente demonstrada”, afirmou a ministra.

Na sequência foi a vez de Luiz Fux proferir o seu voto, destacando que o STF tem o dever de proteger as minorias, quando elas têm uma defesa deficiente. Além disso, ele destacou que o reconhecimento da criminalização de condutas de homofobia gera inserção e respeito recíproco, além de aumentar a autoestima da minoria e confortar com a sensação de pertencimento da sociedade.

“A violência contra a comunidade LGBT não é apenas física. Por exemplo, se um estabelecimento comercial proíbe contratação de homossexual, comete um delito homofóbico, configurando uma violência simbólica, que é tão alarmante quanto a violência física.”. Por fim, ele finalizou: “Depois do Holocausto, jamais se imaginou que um ser humano poderia ser alvo dessa discriminação e violência”.

Seis dos 11 ministros já votaram a favor da ADO 26 e MI n. 4733. Para a próxima sessão, no dia 5 de junho, restam os votos do presidente Dias Toffoli e dos ministros Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski.

Julgamento quase foi adiado

Na abertura do julgamento, o ministro Celso de Mello, um dos relatores, disse que recebeu um documento do Senado constando que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) havia aprovado, na quarta-feira, 22 de maio, um projeto sobre a criminalização da homofobia. O Projeto de Lei 672/19 inclui na Lei de Racismo (Lei 7.716, de 1989) a discriminação por orientação sexual ou de identidade de gênero, mas faz uma exceção para garantir a liberdade religiosa. A Comissão também aprovou o PLS 191/2017 que estende os direitos da Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006) a mulheres transgênero e transexuais.

Celso de Mello disse que já esperava tal movimentação antes do julgamento, e reforçou que não obstante respeitável o esforço do Congresso de debater o assunto, continuava a haver ausência e inércia – quadro de permanente indefinição que inviabiliza a votação de lei contra a prática de discriminação contra homossexual e transgênero.

O decano afirmou que o fato de existirem em tramitação algumas proposições acerca do tema não significa que não existe mora exagerada. “Passaram-se mais de 30 anos, então há omissão inconstitucional. Por isso, havia a necessidade de continuar o julgamento nesta sessão, e não adiá-lo. A mera presença de projeto de lei no Congresso Nacional não garante sua aprovação. Mesmo com aprovação de projetos no Congresso, isso não significa que o presidente vai sancionar e, portanto, permanece a omissão legislativa”, destacou.

Antes de Dias Toffoli dar sequência e sugerir um novo plano de votação, Celso de Mello pediu a palavra novamente e afirmou que os votos levaram a pedidos de impeachment contra os quatro ministros que já tinham reconhecido a omissão do Congresso por não criminalizar a homofobia, demonstrando intolerância dos denunciantes uma vez que o fundamento invocado de falta de decoro não tem aplicação ao caso.

Após a fala de Celso, Toffoli desistiu de fazer proposta ao plenário e propôs uma votação para definir se eles dariam prosseguimento ao julgamento ou se iriam aguardar o projeto do Congresso. Por 9 votos a 2, os ministros decidiram continuar a sessão. Apenas Toffoli e Marco Aurélio votaram para o adiamento.