Entre as ações do Dia das Crianças, celebrado na última segunda-feira (12), o Conselho Nacional de Justiça – CNJ sinalizou a realidade de milhares de meninos e meninas de todo o país que vivem com a esperança de serem acolhidos por uma nova família. Dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento – SNA indicam que mais de 30 mil crianças e adolescentes estão em situação de acolhimento em mais 4.533 unidades em todo o país. Deste total, apenas 5.154 mil estão aptas a serem adotadas.
Um jovem pode receber a medida protetiva de acolhimento institucional ao se detectar uma situação de risco, negligência, abandono, maus-tratos, entre outras violações de direitos. A medida tem caráter temporário, até o retorno da acolhida, por adoção ou reintegração familiar, considerando o melhor interesse da criança e do adolescente.
Em outubro de 2019, o SNA passou a ser obrigatório no tribunais, e conta atualmente com um inédito sistema de alertas, com o qual os juízes e as corregedorias podem acompanhar todos os prazos referentes às crianças e adolescentes acolhidos e em processo de adoção, bem como de pretendentes. O objetivo é dar mais celeridade na resolução dos casos e maior controle dos processos. Atualmente, a região Sudeste registra mais de 15 mil crianças abrigadas, a maior quantidade do país. Já a região Norte é a que tem o menor registro, com pouco mais de 1,9 mil crianças acolhidas.
O tempo que as crianças permanecem nos abrigos é um dos aspectos relevantes a serem observados. Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, esse período não pode ultrapassar 18 meses.
Atualmente, 7.997 crianças na fase da primeira infância – de 0 a 6 anos –, estão em situação de acolhimento, sendo pouco mais da metade do sexo masculino. Deste total, 1.875 crianças com até 3 anos aguardam até seis meses pelo retorno à família de origem ou pela adoção. Já a maior parcela das crianças entre 3 e 6 anos permanece entre 12 e 24 meses nas unidades de acolhimento.
A faixa etária que compõe a maior parte dos abrigados no Brasil são os adolescentes. São 8.643 com mais de 15 anos, sendo mais da metade do sexo masculino. Deste total, 3.142 estão abrigadas há mais de três anos e não têm irmãos nas mesmas condições.
Preferências na adoção
Para o magistrado e vice-presidente da Comissão de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Fernando Moreira, esses números de jovens à espera de adoção no Brasil seguem tão altos porque ainda há uma preferência em adotar crianças na primeira infância
“Da parte dos pretendentes, apesar dos trabalhos realizados para a ampliação do perfil desejado à adoção, ainda há uma preferência por crianças saudáveis e menores de 3 anos de idade. Esse é um perfil bastante diverso da maioria das crianças e dos adolescentes atualmente disponíveis para a adoção no país”, afirma.
Impactos da pandemia
De acordo com o especialista, outro critério que precisa ser levado em conta, neste ano, é a pandemia da Covid-19, que prejudicou os trabalhos nas varas da infância, já que as equipes técnicas ficaram impedidas de realizar atendimentos e produzir o indispensável laudo psicossocial.
“Muitas varas levaram muito tempo para começar a realizar as audiências por videoconferência. Por fim, as visitas aos acolhimentos ficaram impedidas para evitar a propagação da doença. Tudo isso prejudicou o trâmite processual no período”, explica o magistrado.
Outras formas de convivência familiar e comunitária
Com todas essas variáveis, Fernando Moreira enfatiza que é preciso continuar investindo na ampliação do perfil para adoção de modo que o pretendente tenha contato com crianças maiores, sobretudo com os adolescentes.
“Além disso, é fundamental trabalharmos com outras formas de convivência familiar e comunitária além da adoção, como as famílias acolhedoras. Apesar de ser uma política pública, prevista expressamente no ECA, ainda não é realidade na maioria dos municípios brasileiros”, ressalta o especialista.
Trabalho com os adolescentes
Com essa preferência da adoção por crianças mais novas, os mais velhos acabam por passar toda a sua adolescência em abrigos. À medida em que o tempo vai passando, novos desafios aparecem em suas vidas. Dentre elas, a principal é o que eles farão da vida quando entrarem na vida adulta.
O vice-presidente da Comissão de Adoção do IBDFAM aponta que é fundamental a tentativa de inserção do adolescente no mercado de trabalho, durante o período em que estiver acolhido, para que ele possa ter uma vida independente após a maioridade.
“É fundamental que cobremos do Poder Executivo a implantação das chamadas repúblicas nos municípios para que a passagem do acolhimento para uma vida independente não seja feita de forma abrupta. Infelizmente, apesar da previsão na legislação da assistência social, são poucos os municípios que investiram em repúblicas”, diz.
Crianças Invisíveis
Fernando Moreira ainda aponta a necessidade de projetos como o Crianças Invisíveis, do IBDFAM, que chamam a atenção para a infância e a juventude, para que consigamos o envolvimento da sociedade civil organizada.
“A sociedade precisa saber que há milhares de crianças e adolescentes vivendo em acolhimentos no país e que a sua participação é fundamental para a mudança dessa realidade, quer por meio de novas habilitações para adoção, quer pela efetiva e ininterrupta cobrança de ações concretas por parte dos três Poderes da República”, conclui o magistrado.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do CNJ)