A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu um pedido de adoção póstuma que apresentou prova inequívoca de vínculo familiar. A decisão anterior havia declarado a impossibilidade jurídica de um pedido de adoção em razão de o adotante não ter proposto a ação em vida.
No caso, dois irmãos foram adotados de forma informal na década de 1970. O Tribunal de Justiça reconheceu a filiação socioafetiva com o homem falecido, mas o acórdão, sob a alegação de ausência de norma específica, entendeu não haver condições jurídicas para o acolhimento do pedido de adoção, formulado pelos adotandos e pela viúva.
No STJ, o relator, desembargador convocado Lázaro Guimarães, votou pela reforma da decisão. Segundo ele, “a jurisprudência evoluiu progressivamente para, em situações excepcionais, reconhecer a possibilidade jurídica do pedido de adoção póstuma, quando, embora não tenha ajuizado a ação em vida, ficar demonstrado, de forma inequívoca, que diante da longa relação de afetividade, o falecido pretendia realizar o procedimento”.
Inúmeras foram as provas reconhecidas em segunda instância, tais como fotos, documentos e testemunhas que comprovaram que os irmãos cresceram na família como membros natos, figurando o falecido como pai dos autores da ação. “A adoção póstuma se estabelece diante do reconhecimento da paternidade socioafetiva como realidade social e em homenagem ao princípio da dignidade da pessoa humana, permitindo que um indivíduo tenha reconhecido seu histórico de vida e sua condição social, com preponderância da verdade dos fatos sobre os aspectos da formalização da adoção”, afirma o relator.
Para a advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão de Adoção do IBDFAM, a decisão foi acertada, uma vez que as relações socioafetivas consolidadas pelo tempo têm reconhecimento jurídico, ou seja, é o reconhecimento do afeto como valor jurídico.
“A ausência da judicialização não significa a não consecução do direito, assim como a ausência de lei não significa a ausência de direitos. Louvável a decisão do STJ ao reconhecer que, no caso concreto, a adoção sempre existiu para os dois irmãos. A família se consolida pelos laços socioafetivos’, afirma.
Ainda segundo Silvana Moreira, temos, em direito, que atentar para o princípio da boa-fé, não inferindo, em quase tudo – notadamente em função da crise de valores na qual vivemos no Brasil – a possibilidade de existência de má-fé. Relações afetivas são comprovadas, as provas são fartas e substanciais.
“Nós ainda temos como ponto cultural deixarmos ‘para depois’ questões cruciais, às vezes por nos sentirmos imortais ou por desconhecermos a necessidade de propositura de procedimento judicial para reconhecer. No mundo do direito, o que existe no mundo dos fatos, ou seja, a judicialização do amor e do cuidado”, finaliza a advogada.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)