De autoria de Mário Luiz Delgado, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, e Jânio Urbano Marinho Júnior, defensor público federal, o artigo “Posso renunciar à herança em pacto antenupcial?” é um dos destaques da 31ª edição da Revista IBDFAM – Famílias e Sucessões.
De acordo com os autores, o texto propõe uma nova interpretação ao artigo 426 do Código Civil, afastando-se de uma leitura tradicional e pouco refletida do dispositivo, o que tem levado, desde o advento do Código Civil de 1916, à condenação absoluta da renúncia prévia, em pacto antenupcial ou contrato de convivência, de qualquer direito sucessório por parte de cônjuges ou companheiros.
Mário Luiz Delgado explica que a quase unanimidade da doutrina tem afirmado, desde Beviláqua, ser nula a manifestação de vontade relativa a direitos hereditários futuros, em face da vedação legal à disposição contratual de herança de pessoa viva de que trata o art. 426 do Código Civil.
“O nosso artigo se contrapõe a essa interpretação, que tem sido ‘hiperbolizada’ a ponto de atingir situações não abrangidas em seu conteúdo restritivo. Defendemos, assim, ser possível e perfeitamente válida, por exemplo, a renúncia prévia ao direito concorrencial, quando as partes convencionam, em pacto antenupcial ou em contrato de união estável, que nenhum dos pactuantes concorrerá com os descendentes ou ascendentes do outro. Afastando, assim, a regra de concorrência dos incisos I e II do art. 1.829, e que, aberta a sucessão pelo falecimento de qualquer deles, todo o seu patrimônio reverterá exclusivamente para os respectivos descendentes ou ascendentes,” enfatiza.
Jânio Urbano Marinho Júnior, coautor do texto, ressalta que o objetivo do artigo é fomentar uma discussão a respeito da abrangência da vedação aos pactos sucessórios, regra essa que sempre constituiu, praticamente, um dogma no direito brasileiro desde o Código Civil de 1916.
“Para tanto, o texto traz uma conceituação dos diversos tipos de pactos sucessórios, expondo todo o aparato normativo da questão, a evidenciar que, não obstante o disposto no art. 426 do Código Civil, mesmo atualmente é possível observar algumas exceções à regra da vedação dos pactos sucessórios, podendo-se incluir, na mesma linha, a possibilidade de renúncia dos direitos concorrenciais de cônjuges ou de companheiros, em pacto antenupcial ou em contrato de convivência”, afirma.
Para Mário Delgado, a mera renúncia ao exercício futuro do direito concorrencial, do direito de concorrer com descendentes ou ascendentes quando da futura sucessão do parceiro, não se enquadra na vedação prevista no art. 426. Inclusive porque, segundo ele, não existe qualquer restrição à renúncia de direito futuro ou de expectativa de direito, salvo quando a lei assim o determina de modo expresso.
“Sempre que o Código Civil quer proibir a renúncia a direito futuro, ele o faz expressamente, como no caso do art. 556, que proíbe ao doador renunciar antecipadamente ao direito (futuro) de revogar a doação por ingratidão. Se fosse ínsito ao sistema a impossibilidade de renúncia a direito futuro, a proibição do art. 556 seria desnecessária”, diz.
Mário Delgado destaca que esse tema, que parecia pacificado, ressurgiu com muita força nos debates acadêmicos da atualidade “notadamente depois que o cônjuge sobrevivente – e talvez o companheiro – foram promovidos à categoria de herdeiros necessários, sem que tal decisão, legislativa e jurisprudencial, contasse com qualquer adesão social”, comenta.
“Isso tem forçado as famílias conjugais a recorrerem aos mais diversos arranjos contratuais no afã de fazer prevalecer a própria autonomia patrimonial na sucessão, afastando, assim, a concorrência sucessória do sobrevivente com os descendentes exclusivos do falecido”, afirma.
Para Jânio Urbano, trata-se de um tema extremamente atual: “Porque pretende apresentar uma nova leitura do art. 426 do Código Civil, seguindo tendência mundial de se flexibilizar a proibição dos pactos sucessórios, a fim de se adequar à realidade das famílias brasileiras, que buscam conferir uma maior autonomia aos seus membros, amparadas no princípio da intervenção mínima nas relações familiares”, finaliza.
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Fonte: IBDFAM