testamentos

Existem no Direito brasileiro duas categorias de testamentos: ordinários e especiais. Os testamentos ordinários são aqueles que, em regra geral, salvo algumas exceções da lei, todas as pessoas capazes poderão fazê-lo. A advogada e professora Lisieux Borges, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), explica que a capacidade para testar é uma capacidade especial, que se dará a partir dos dezesseis anos de idade e que são três as espécies de testamentos ordinários ­ testamento público, testamento cerrado e testamento particular.

Já os testamentos especiais são aqueles testamentos que a lei exige para sua confecção que seus titulares possuam algumas características pessoais específicas, bem como estejam em circunstâncias especiais, que os impossibilitem de fazer os testamentos pelas vias ordinárias. Lisieux afirma que a especialidade se dá em razão da pessoa e das circunstâncias, mas a formalização destes testamentos se dará através de testamento público ou cerrado. Seria, por exemplo, o caso de alguém que a bordo de uma embarcação militar, ou mercante, deseje testar, temendo não sobreviver, porém, uma vez sobrevivo, e alcançado terra firme, o testamento caducará se o testador não morrer na viagem, nem nos noventa dias subsequentes ao seu desembarque.

Os testamentos especiais também possuem três espécies: testamento marítimo, aeronáutico e militar. Borges diz que muito embora nossa lei civil afirme que as pessoas capazes podem testar através destas espécies testamentárias, ordinárias ou especiais, para algumas pessoas existem restrições ou mesmo supressão destas possibilidades, ainda que capazes, e mesmo que possam exprimir sem quaisquer embaraços sua vontade de modo pleno.

“Há, para certas pessoas, então, a pressuposição de incapacidade para testar em razão de suas deficiências sejam de natureza física ou mental. Estas pessoas acabam por ser obrigadas a testar por algum modo específico, havendo real diminuição de sua liberdade, ou faculdade de testar, como no caso da pessoa cega, que apenas pode testar através da forma pública (art.1867, CC/02). Ou ainda, no caso, por exemplo, de pessoa surda-muda, que apenas lhe é facultada a forma cerrada de testamento (art. 1873, CC/02)”, explica Lisieux.

Existem, ainda, segundo ela, situações em que nem mesmo se concedem a certas pessoas a possibilidade de testar. “Veda­-se, totalmente, a liberdade de disporem de seu patrimônio, em real desrespeito aos direitos fundamentais a todos garantidos em nossa Constituição Federal de 1988. Como na hipótese, por exemplo, de pessoa que seja cega, surda e muda (mas, que mesmo assim, consigam se expressar, como no famoso exemplo da Hellen Keller, escritora norte­americana), ou ainda, na hipótese de pessoas surda­muda, que não seja alfabetizada ainda em português, mas, apenas em linguagem de sinais”.

Lisieux defende que é necessária uma profunda adequação de nossa legislação testamentária “à luz da principiologia constitucional, de modo que nossas leis sobre o tema tornem­se mais inclusivas, respeitando as diferenças das pessoas com deficiência. E, consequentemente, concedendo para estas pessoas a possibilidade de que testem de acordo com sua dignidade e respeitada a autonomia que merecem, enquanto pessoas livres e capazes”.

A necessidade de uma perspectiva inclusiva em nossas leis civis, ela afirma, trata-se de questão imperativa, ordem do dia, principalmente, em nossa atualidade, em que podemos utilizar a tecnologia que dispomos como forma de suprimir, ou diminuir, as limitações trazidas pelas deficiências. “Hoje, estas tecnologias, chamadas de assistivas podem ser de diversas sortes, como por exemplo, softwares de computadores que fazem leituras de textos, gravadores digitais, impressora em braile, assinaturas digitais, biometria, entre outros, que poderão permitir que mesmo com algum grau de deficiência, todas as pessoas possam livremente exprimir sua vontade em quaisquer negócios jurídicos, inclusive, os testamentos.

Videotestamento –

Lisieux é entusiasta da possibilidade das pessoas poderem fazer um videotestamento, já que hoje, com a tecnologização intensa e cada vez maior de nossas práticas sociais, passa a ser ordem do dia que todos os atos jurídicos, e não apenas os testamentos, sejam pensados e repensados sobre esta ótica da tecnologia e da informatização, que estão hoje a nossa disposição.

“O videotestamento, como defendo, não se trata de uma nova espécie testamentária, mas sim, uma forma, um modo que as pessoas poderão também expressar suas disposições testamentárias. Trata­-se, na verdade, de aceitar que as espécies legais de testamentos, que já possuímos, sejam instrumentalizados por outras mídias diferentes daquela escrita e cartular, que normalmente os testamentos são feitos entre nós. Deste modo, poderiam, inclusive, serem feitos por vídeo”, disse.

Leia a entrevista completa aqui.

 

Fonte: IBDFAM