Considerada importante marco jurídico na criação de mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) completa 14 anos de sanção em 7 de agosto.
Reconhecendo a violência doméstica como um problema de múltiplas dimensões que não pode ser tratado apenas na esfera criminal, a norma comporta três eixos principais no enfrentamento de agressões contra as mulheres: proteção e assistência; prevenção e educação; combate e responsabilização.
Com a lei em vigência, boa parte da população brasileira teve um contato direto com o assunto, causando um aumento significativo de denúncias de violência familiar e doméstica. Situações de agressão e constrangimento saíram da invisibilidade e passaram a ocupar não apenas o sistema de justiça, mas também se tornou tema de pesquisas acadêmicas e pauta de relevância na mídia, na política e em movimentos sociais. Houve mudança de paradigmas.
Diversos avanços
A advogada Adélia Moreira Pessoa, presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, destaca que a lei foi importante para os diversos avanços no país, uma vez que ela incrementou políticas públicas voltadas para o enfrentamento à violência contra a mulher, deu mais visibilidade ao fato e um olhar mais ampliado para o problema, não mais circunscrito aos grupos feministas.
“Assiste-se gradativamente a uma maior atenção à questão nos três poderes, no Ministério Público, na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, no IBDFAM e na sociedade civil de maneira geral. Com efeito, foram criadas as várias Coordenadorias – ou Secretarias – da Mulher, no âmbito municipal, estadual e federal da administração pública, multiplicando-se os serviços de atendimento à mulher e à família, inclusive com a criação de mais delegacias especializadas”, afirma.
Desta maneira, a existência da Lei Maria da Penha e sua divulgação em vários espaços tiveram também função educativa para que as mulheres nessa situação tomassem consciência das várias formas de violência a que eram submetidas, bem como de seu direito de buscar alguma forma de se livrar dessa situação.
“Com efeito, a mulher adquire maior força de levar a violência doméstica a que era submetida ao conhecimento das autoridades e consegue ver os resultados. Constata-se um maior número de inquéritos instaurados, nos 14 anos da vigência da lei, como se pode exemplificar, com dados obtidos na Delegacia de Atendimento à Mulher de Aracaju- DEAM, que atende mulheres de 18 a 59 anos. No ano 2006, ano em que foi editada a Lei Maria da Penha, foram instaurados apenas 71 Inquéritos Policiais – IPs. Em 2007 foram 248 IPs, com crescimento contínuo, verificando-se que apenas no primeiro semestre de 2020, na DEAM de Aracaju já foram instaurados mais de 600 IPs”, aponta.
Luta pela educação
Apesar de tantos avanços, a advogada destaca que ainda há muito o que percorrer para que os casos diminuam significativamente. Para ela, a violência doméstica não pode ser visto como um ato isolado, mas como fenômeno histórico-social que emerge de uma complexa combinação de fatores, fazendo-se presente em todas as classes sociais.
“Sem dúvida, a Lei 11.340/2006 trouxe maior visibilidade à violência doméstica e representa substancial avanço normativo no enfrentamento à violência contra a mulher. Entretanto, nenhuma norma isolada é suficiente para coibir a violência de gênero, que assume caráter de ‘pandemia’. É necessário que esta ‘pandemia’ que é a violência doméstica seja enfrentada não só na justiça, mas por meio de políticas públicas efetivas e, especialmente, pela educação”, enfatiza.
Além disso, a especialista frisa que é necessário o diálogo com outros saberes, especialmente a Psicologia e o serviço social.
“É preciso repetir sempre: mudanças de posturas quanto aos direitos humanos das mulheres não são consequência automática da sociedade democrática. É indispensável um esforço conjunto da família, da sociedade e do poder público, um trabalho em rede efetivamente. Sem dúvida, a violência contra a mulher não é apenas um acontecimento da vida privada, pois em briga de marido e mulher o Estado precisa meter a colher”, conclui a presidente da comissão.
Problema de toda a sociedade
A juíza Ana Florinda Dantas, vice-presidente da mesma comissão do IBDFAM, destaca a importância da lei ao longo desses 14 anos de sanção e faz fez ressalvas quanto à necessidade de avanços.
“O principal avanço foi a conscientização da sociedade para o fato de que a violência doméstica não é assunto da intimidade do lar, mas um problema de interesse da sociedade e um crime a ser combatido. A criação de estruturas de apoio e suporte às vítimas para que se sintam encorajados a denunciar e não permaneçam dependentes do agressor. A diminuição é muito pequena porque a violência doméstica é encarada somente como um problema que afeta a mulher e por isso não é trabalhada entre todos os membros da família como um fenômeno intrafamiliar”, diz.
Congresso
Com o lema “Violência Doméstica e Familiar: violação dos direitos humanos”, será realizado nos dias 15 e 16 de outubro o I Congresso Virtual do IBDFAM – Família, Gênero e Direitos Fundamentais.
Com foco no debate da violência doméstica intrafamiliar, proteção, prevenção e preservação de direitos de seus integrantes, o evento terá como objetivo repensar e revelar preconceitos e estereótipos que ainda permeiam nosso cotidiano. Serão debatidas formas para contribuir na sensibilização quanto aos desafios de enfrentamento da violência doméstica e suas repercussões nas ações familistas. Em breve, mais informações.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM