Uma mulher conquistou o direito de conviver com um cachorro, atualmente sob tutela do ex-marido. O casal esteve junto por quatro anos, período em que a autora da ação viveu junto ao animal. Depois da separação, ela quis manter o contato com o pet. A decisão é da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS.
Em primeiro grau, o pedido foi negado, mas o TJRS deu ganho de causa à mulher. No recurso, ela alegou ter criado forte vínculo afetivo com o cachorro durante a convivência conjugal. O ex-marido não se opôs ao pedido e nem sequer se manifestou no recurso. Assim, a cada duas semanas, ela poderá buscar o pet para passar o dia com ela.
Em seu voto, o relator, desembargador José Antônio Daltoé Cezar citou que juízes têm usado, por analogia, regras que disciplinam a guarda compartilhada dos filhos para decidir questões envolvendo pets. Para ele, contudo, não é necessário se valer de institutos do Direito de Família para esses casos.
“Não se pode julgar o pedido de visitação de animal de estimação sob a ideia que estratifica o direito de propriedade, tampouco o de aplicar o Direito de Família, elevando o animal à condição de pessoa, ainda que se reconheça a condição de ser dotado de sentidos”, ponderou Daltoé.
Acompanhado pelos demais desembargadores, ele concluiu: “Ao magistrado caberá apurar, caso a caso, a relação de afeto com o pet, sendo que no caso sub judice, evidenciado o vínculo existente entre a apelante e o cachorro, motivo pelo qual acolho o pedido de reforma da sentença, para que seja oportunizada às visitações, devendo ser mantida a convivência com o animal”.
Conflitos envolvendo pets crescem na Justiça
Em entrevista ao Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, José Antônio Daltoé Cezar afirma que vê como crescente a recorrência na Justiça de casos do tipo. No último ano, o desembargador atuou em três processos envolvendo a mesma temática. Mesmo destinando um olhar sensível a essas situações, ele admite ter dificuldade em aceitar o conceito de família multiespécie, que ainda divide opiniões na comunidade jurídica.
“Diferentemente de outros posicionamentos, friso que não dá para aplicar as regras do Direito de Família às situações envolvendo animais de estimação. Entendo que eles continuam sendo propriedade das pessoas e deve-se observar o regime de bens do casal para decidir com quem ficar. Contudo, as situações que temos que resolver, enquanto magistrados de Família, nem sempre estão dentro desses conceitos”, avalia Daltoé.
Por isso, ele se baseou no direito francês na formulação do acórdão. “O juiz de família tem de resolver essas questões, com visitação e com quem vai ficar o animal, mas este ainda continua sendo propriedade. Há um meio termo entre aqueles que dizem que os pets são só propriedade e outros que os veem como parte de uma família multiespécie. Penso, por exemplo, que não é possível aplicar a guarda compartilhada a esse tipo de situação”, opina.
Com a boa repercussão de sua decisão, Daltoé prevê que o acórdão possa firmar um precedente para resoluções semelhantes. “Esse tema ainda vai ser muito debatido. O ideal é que essas questões não fossem levadas ao Judiciário, resolvidas pelas próprias pessoas, mas a vida não é assim. Sendo colocadas para a Justiça, não podemos nos abster de dar uma definição. É a nossa obrigação constitucional”, conclui o desembargador.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações da GaúchaZH)