Com a alegação de que teria sido ofendida pelo ex-marido por meio de conversa em aplicativo de mensagens, uma mulher teve negado o pedido de indenização por danos morais. A decisão é da 3ª Vara Cível da Comarca de Araranguá, em Santa Catarina, que entendeu que o ocorrido em questão não enseja reparação civil.
O caso envolveu um ex-casal que passou por vicissitudes em relacionamento amoroso quando encerrado. Para a juíza responsável pelo caso, “somente a dor e o vexame que transcendem os meros dissabores da vida cotidiana são aptos a dar ensejo à responsabilidade civil”.
É presumível, segundo a magistrada, que as palavras do requerido provocaram desconforto e denotam “clarividente falta de maturidade e respeito com o próximo”. Contudo, aceitar que eles merecem tutela jurisdicional é desarrazoado. O episódio desconfortável pode servir de aprendizado para as partes litigantes, nas palavras da juíza.
A vida não é um estado de graça, frisou juíza
A sentença também destaca o fenômeno da “judicialização” na sociedade contemporânea. O Poder Judiciário tem sido acionado para resolver todo e qualquer conflito. “Virou uma extensão da instância familiar e se quer dele muito mais que um mero sopeso de direito, mas um amparo emocional contra o desamparo que é a vida e a condição humana.”
Ela explica, na decisão, que não minimiza a ofensa, que é crime e por essa via deve ser punido, mas enfatiza que a vida não é um estado de graça. “Quero assim dizer que entender o contrário, que não a improcedência da ação, é desvirtuar a instância jurídica e retirar do jurisdicionado a oportunidade de amadurecimento diante dos acontecimentos da vida.”
Fenômeno da judicialização
Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família seção Santa Catarina – IBDFAM/SC, a advogada Luciana Faísca diz que a decisão foi equilibrada. “O Poder Judiciário não deve ser o ponto para debates e discussões a respeito do fim de um relacionamento”, comenta a especialista.
“A sentença acertou ao não fomentar a judicialização de todos os conflitos havidos no fim das relações. Quando se passa por um rompimento conjugal, vive-se possivelmente um dos piores momentos da vida. O luto, a dor da separação, os planos que foram deixados para trás e as expectativas frustradas por vezes são expressos com ofensas”, avalia Luciana.
Ela acrescenta: “Se essas ofensas não ultrapassam um limite, não chegam a ser violações físicas nem psicológicas, mas apenas uma troca de desajustes entre as partes, não há necessidade de se levar isso à Justiça. Aliás, o Judiciário não deve acolher essa pretensão, muito menos com fins indenizatórios”.
Mediação pode ser o caminho adequado
A advogada aponta a mediação como um caminho possível para a resolução de conflitos dessa ordem. “As partes podem buscar a conversa, resgatando para si o poder de tomar as decisões em um ambiente de respeito e sigilo, em que podem conversar sobre detalhes que faltaram e precisam ser assentados a respeito do fim do relacionamento.”
A intervenção terapêutica também pode atender a essas situações, segundo Luciana Faísca. A atuação de psicólogos, psicanalistas e psiquiatras dá o suporte para que as partes passem por esse momento de conflito com o término da união.
“A mediação pode ser um importante caminho para que as partes busquem a comunicação não violenta e não ofensiva. Ao contrário, uma comunicação construtiva que atenda os interesses dos envolvidos. Assim, evitamos a judicialização e deixamos ao Judiciário a resolução de questões jurídicas de maior complexidade e em que não é possível a autocomposição”, conclui Luciana.