As inovações trazidas pelo CPC/2015 alcançaram também as questões práticas do preparo recursal. Antes do estabelecimento do novo Código de Processo Civil, quem não estava sob a assistência judiciária tinha que recolher o porte de remessa, além das custas recursais (preparo). E, caso o valor não estivesse correto, era impossível complementá-lo. Antigamente, quando se juntava a cópia do recibo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não admitia o recurso, sob a alegação de que um dos pressupostos para admissibilidade recursal do preparo não foi cumprido. Portanto, o recurso era considerado deserto.
Entretanto, o CPC/2015 alterou essa dinâmica e, agora, dará oportunidade para que a parte supra a lacuna. Sendo assim, será permitido juntar o comprovante original, admitindo o recurso devido ao reaproveitamento dos atos processuais. Com isso, evita-se que o litigante perca a possibilidade do duplo grau de jurisdição (segunda instância). Confira a entrevista com o advogado Aldo de Medeiros Lima Filho, vice-presidente da Comissão de Advogados de Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, e entenda de que maneira a modificação irá alterar o desenvolvimento processual.
Como fica o preparo recursal a partir do CPC/2015 , principalmente com o Processo Judicial Eletrônico (PJe)?
Houve, indiscutivelmente, um avanço na prática de interposição dos recursos perante os Tribunais, com o advento do Novo Código de Processo Civil. Isto porque as exigências formais vigentes com o Código de 1973 haviam ultrapassado em muito sua função de dar condições de igualdade de armas às partes litigantes e estavam sendo mais instrumento de redução do fluxo de recursos a serem apreciados pelos Tribunais do que a fazer justiça. Este avanço observado na flexibilização de regras veio a calhar, com a adoção pelos Tribunais do processo judicial eletrônico – PJe, sendo que muitos dos atos acessórios anteriormente praticados pelas partes e pelos serventuários perderam sua importância ante a comunicação imediata dos atos pela via digital.
Com relação ao princípio do reaproveitamento dos atos processuais, caso houvesse equívoco como, por exemplo, a juntada da cópia do recolhimento de custas, antes do CPC/2015, corria-se o risco do recurso ser considerado deserto. Com isso, acarretaria a não admissão, por falta de um dos pressupostos de admissibilidade recursal. Aparentemente, essa regra mudou com o Novo Código de Processo Civil. Na sua opinião, a alteração é positiva? Podemos considerá-la um avanço?
A regra mudou sim, e de forma muito positiva. O parágrafo 7º do art. 1.007 do CPC/2015 indica – expressamente – que, em caso de equívoco ou dúvida na interpretação do devido preparo, o Relator pode determinar prazo de cinco dias para que a parte sane a falha ou esclareça o fato. Anteriormente, havia um prejuízo insanável, uma vez que a praxe adotada nos Tribunais era de fulminar os recursos nestes casos de vício de qualquer espécie no preparo, de forma que, muito raramente, o advogado conseguia demonstrar que o preparo havia sido oportuna e adequadamente consumado, e que teria havido um erro de tramitação no próprio Tribunal.
Estaria o diploma processualista, de 1973, comprometendo ao duplo grau de jurisdição, por exigência de rigor excessivo em detrimento da justiça?
Entendo que, embora não fosse este o desejo do legislador de 1973, a prática das Cortes nacionais realmente estava desvirtuando o necessário duplo grau de jurisdição, ao buscar mínimos vícios para descartar iniciativas recursais, no mais das vezes com robustos fundamentos materiais que sequer eram apreciados por conta do aborto do seu processamento, sob argumentos de vício formal.
Se hoje há PJe, podemos entender que o porte de remessa deixou de existir?
O parágrafo 3º do art. 1.007 do CPC/2015 indica – expressamente – que é dispensado o recolhimento do porte de remessa e de retorno no processo em autos eletrônicos. Entretanto, há ainda muita incerteza acerca de situações em que os autos são digitais numa instância e físicos na outra, como ocorrem em muitos Tribunais Estaduais. Nestes casos, o advogado deve buscar adequar-se às fontes normativas do Tribunal, quase sempre tornada pública por Provimento da Corregedoria.
O rigor em excesso na admissão recursal como, por exemplo, a exigência de peças consideradas obrigatórias para destrancamento de Recurso Especial, via agravo de instrumento, estaria em desordem com os valores constitucionais como o duplo grau de jurisdição?
As exigências de peças obrigatórias visam dar, às partes, regras claras e igualitárias para a apreciação de suas razões perante os Tribunais Superiores. Assim, a exigência em si não fere o comando constitucional de duplo grau de jurisdição. Eventuais excessos de rigor na aplicação destas regras, sim, fulminam o direito assegurado constitucionalmente. Estes excessos predominavam na aplicação do Código de 1973, esperando-se que, ante as diversas modificações introduzidas no novo Código, os julgadores associem-se ao espírito vetor das modificações, no sentido de valorizar a essência dos recursos, aproveitando os atos processuais, eventualmente com algum vício formal.