Projeto de Lei 1.595/2020, do Senado Federal, que autoriza a intimação judicial por meio de aplicativo de mensagens como o WhatsApp, foi aprovado na semana passada na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania – CCJ da Câmara dos Deputados. Com a tramitação em caráter conclusivo, o texto poderá seguir para sanção presidencial, a menos que haja recurso para votação pelo Plenário.

Desde 2017, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ permite a utilização do WhatsApp para a comunicação de atos processuais às partes. A proposta aprovada recentemente busca a segurança jurídica na disseminação da prática, já adotada por alguns tribunais pelo país. O texto é do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), com relatoria do deputado Enrico Misasi (PV-SP), e altera o Código de Processo Civil – CPC (Lei 13.105/2015).

De acordo com o projeto, poderão ser intimados eletronicamente os advogados e as partes que manifestarem interesse por essa forma de comunicação. Para a intimação ser cumprida, deverá haver confirmação de recebimento da mensagem no prazo de 24 horas após o envio.

A resposta deverá ser encaminhada por meio do aplicativo, em mensagem de texto ou de voz, usando-se as expressões “intimado(a)”, “recebido”, “confirmo o recebimento” ou outra expressão análoga. Caso não haja confirmação de recebimento no prazo, deverá ser feita outra intimação.

Possibilidade requer cautela, diz especialista

“A possibilidade, embora interessante, precisa ser considerada com cautela”, comenta a advogada e professora Fernanda Tartuce, presidente da Comissão de Processo Civil do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Ela opina sobre a conformidade do projeto de lei que regulariza a intimação judicial por meio de aplicativo de mensagens com a realidade do país.

“Uma parte considerável dos brasileiros não dispõe de acesso à internet – ou, quando o tem, padece de insuficientes conhecimentos e/ou recursos, não conseguindo usar plenamente os meios digitais. Mesmo quem tem acesso pode sofrer por fatos comprometedores: imagine que alguém, após aderir à intimação por aplicativo, tenha o aparelho furtado e decida trocar o número”, exemplifica.

A especialista acrescenta que, caso a parte esqueça de avisar o cartório judicial, será considerado válido, em prejuízo dela, um número que não mais lhe pertence. “O Poder Judiciário e o legislador precisam considerar o tema ‘citações e intimações eletrônicas’ sob os prismas da segurança jurídica e do contraditório efetivo e adequado.”

Previsões legais relacionadas ao tema

A advogada afirma que a Lei 11.419/2006 é exigente quanto à “identificação inequívoca” do destinatário de citações, intimações e notificações: só admite como formas de aferição da identidade o cadastro do usuário no Judiciário e a assinatura digital baseada em certificado digital (art. 1°, §2°, III).

“Além disso, é problemática a vinculação de empresas privadas, sobretudo não credenciadas, às práticas judiciais – segundo o artigo 14 da citada lei, ‘os sistemas a serem desenvolvidos pelos órgãos do Poder Judiciário deverão usar, preferencialmente, programas com código aberto, acessíveis ininterruptamente por meio da rede mundial de computadores, priorizando-se a sua padronização’”, ressalta Fernanda.

A especialista julga como necessária a promulgação de uma lei que regulamente a possibilidade já admitida pelo CNJ, mas com máxima atenção a todos os fatores envolvidos. “Problemas supervenientes poderão ocorrer, sendo importante que uma boa legislação traga respostas a dúvidas que tenderão a surgir”, frisa.

Tendência de digitalização e atenção aos vulneráveis

A possibilidade de intimação por aplicativo de mensagens foi uma das saídas encontradas pelo Poder Judiciário em meio às repercussões da pandemia da Covid-19. Vários outros procedimentos também migraram para o meio digital, já que a proliferação do coronavírus impôs o distanciamento social. Para Fernanda Tartuce, mais que uma consequência do atual momento, a digitalização é uma tendência do ordenamento jurídico brasileiro.

“A informatização judicial vem sendo implementada no sistema brasileiro de forma crescente. No contexto pandêmico, fomos ‘forçados’ a participar de audiências eletrônicas; boas experiências ocorreram para várias pessoas e resistências foram superadas. É preciso avançar, mas não esquecendo as pessoas vulneráveis”, destaca.

A advogada conclui: “O Poder Judiciário e o legislador, ao delinearem novas formas de comunicação, precisam estar apoiados no conhecimento de especialistas em segurança da informação para que os meios a serem adotados atendam à necessária salvaguarda de todos os envolvidos”.


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