O Projeto de Lei 4.288/2021, em tramitação na Câmara dos Deputados, possibilita o divórcio após a morte de um dos cônjuges. O texto prevê essa hipótese quando a ação for iniciada antes do falecimento e os herdeiros optarem por dar prosseguimento.

A proposta, de autoria do deputado Carlos Bezerra (MDB-MT), será analisada em caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Segundo o parlamentar, atualmente, a única alternativa juridicamente possível nestes casos é a dissolução do casamento válido pela morte de um dos cônjuges.

O deputado entende que isso contraria o interesse e a vontade daqueles que, antes de falecerem, haviam pedido para finalizar o casamento pelo divórcio. “O divórcio é um direito incondicional de qualquer um dos cônjuges a prescindir de contraditório ou dilações indevidas, exceto no tocante a questões que envolvam o patrimônio ou interesses de filhos menores e incapazes.”

Para Carlos Bezerra, o projeto deve aprimorar o Código Civil para estabelecer expressamente a possibilidade de divórcio após a morte. A justificativa do projeto cita julgamento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG, no qual prevaleceu a tese do advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

Perverter o espírito maior da lei

Em agosto de 2021, o TJMG concedeu o divórcio post mortem ao apreciar um recurso movido pela filha de um homem que morreu, no ano anterior, por Covid-19. O presidente do IBDFAM atuou no caso em que o marido entrou com o pedido de partilha de bens, mas morreu no curso do processo.

A questão foi inicialmente julgada sem resolução de mérito em razão da morte de uma das partes. Para Rodrigo da Cunha Pereira, “atribuir o estado civil de viuvez a quem já tinha se manifestado, e até tentando concretizar o divórcio pela via judicial, é perverter o espírito maior da lei, que deve sempre ser interpretada em consonância com outras fontes do Direito”.

O advogado avalia positivamente iniciativa da proposta legislativa, “pois deixar de se decretar o divórcio, quando uma, ou mesmo ambas as partes falecem no curso do processo, seja consensual ou litigioso, é fazer da lei (regra jurídica) um fetiche, é inverter a relação sujeito/objeto, e apegar-se excessivamente à formalidade jurídica em detrimento de sua essência”.

Rodrigo entende que, “se o casamento já havia acabado, os seus efeitos jurídicos devem se dar a partir da separação de fato do casal, associado à intenção de não mais voltarem ao casamento”. “Portanto, necessária a aprovação da respectiva proposta legislativa, para dar efetividade à verdadeira intenção da Emenda Constitucional n. 66, que tornou o divórcio um direito potestativo, não cabendo mais poder-dever e, sim, poder de sujeição quando uma das partes deseja.”