Uma das formas mais recorrentes de se perpetuar o racismo ocorre quando há tentativa de deslegitimar ou se apoderar do lugar das vítimas dessa forma nefasta de discriminação. Rechaçado por especialistas, o termo “racismo reverso” volta à pauta sempre para designar supostos casos de preconceito contra brancos. Tal entendimento não é admitido por ativistas e estudiosos, afinal, configura-se como uma forma de desvirtuar o foco do efetivo enfrentamento à desigualdade racial no país, que assola negros, indígenas e outros grupos.

“Vivemos em uma sociedade tão imersa no racismo estrutural que há até quem acredite que não existe racismo no Brasil. Além disso, dizer que existe ‘racismo reverso’ é justamente seguir o que essa estrutura racista quer nos fazer acreditar”, explica a advogada Caroline Ingrid de Freitas Vidal, presidente da Comissão de Diversidade Racial e Etnia do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

Confira, a seguir, alguns pontos mencionados pela advogada para comprovar a falácia do racismo reverso:

Pessoas brancas e negras não concorrem em grau de igualdade

Segundo Caroline Vidal, não é possível afirmar que as oportunidades de uma pessoa negra são exatamente iguais às oportunidades de pessoas brancas. “Não posso dizer que a livre concorrência no mercado de trabalho, a situação alimentar ou a oportunidade de se relacionar são iguais.”

Ela acrescenta: “Um branco não é excluído e marginalizado por ser branco, pode ser por outras razões, mas não pela cor da pele”, explica a advogada. Para ela, esse discurso adquire grande proporção porque parte da sociedade brasileira não acredita que exista a necessidade de uma luta racial.

Não somos todos iguais

Por uma herança histórica e cultural negada, e por uma dívida do Estado mantida pelo comportamento social, a igualdade ainda está longe da realidade. Neste contexto, segundo a advogada, pessoas brancas têm utilizado o termo “racismo reverso” para justificar o próprio comportamento discriminatório. Ela exemplifica que nenhuma pessoa é excluída de uma roda de conversa, de um evento social ou de uma entrevista de emprego por ser branca.

“Uma criança, ainda que nunca lhe seja verbalizado que ela é excluída pela cor da sua pele, sente o motivo dessa exclusão. Ela é marginalizada e o tempo todo incapacitada pela estrutura racial que temos. Ainda que a pessoa branca tenha seus problemas de classe, ela não pode dizer que sofre racismo. Existe a discriminação pela classe social, por sua aparência, mas jamais poderá dizer que está sofrendo discriminação em razão da cor da pele”, frisa Caroline.

O negro não pode errar, o branco sim

A advogada pontua ainda que a sociedade não aceita os defeitos, dores e incapacidades, comuns a todos os seres humanos, quando os identificam em pessoas negras. “Os brancos podem errar, pedir desculpas e todo mundo irá perdoar e nutrir empatia. Já uma pessoa negra que erra não é perdoada, não é bem vista e não recupera sua imagem social.”

Para Caroline, isso é ainda mais grave tendo em vista que, por muitas vezes, os negros irão repetir o comportamento opressor e agressivo que lhes foi dado a vida inteira. “Brancos podem divergir de assuntos, cometer erros e ainda sim ter suas imagens ressignificadas, os negros não”, argumenta.

Brasil é um país racista

De acordo com a advogada, a ideia de que o Brasil não é um país racista é propagada para desqualificar aqueles que tentam conscientizar quem mais precisa: os próprios negros. Ela destaca que a luta antirracista é invisibilizada e marginalizada diariamente, o que resulta no enfraquecimento de movimentos importantes. “Perdendo a força, perde-se também a capacidade de emancipação das próprias pessoas que seriam as mais interessadas.”

Caroline reflete: “Pessoas que lutam contra o racismo são vistas como extremistas. Criou-se no imaginário de pessoas negras que, se elas se embranquecerem, serão socialmente aceitas. Isso começa pela estética e vai até o comportamento submisso. Quando resolvemos mostrar nosso potencial, ocupar espaços e cargos de poder, muitos se sentem ameaçados, percebendo que a hegemonia poderá ser prejudicada”, observa a especialista.

 

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM