Em sua 44ª edição, a Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões traz uma decisão comentada pela vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Maria Berenice Dias: “Casados até depois da morte? Considerações acerca dos efeitos jurídicos da separação de fato no ordenamento jurídico – Acórdão do Superior Tribunal de Justiça (AgRg nos EDcl no REsp n. 1.333.425/SP)”.
No texto, a advogada comenta a decisão monocrática que emprestou sobrevida ao casamento para além da morte de um dos cônjuges, o que, segundo a especialista, “olvida a atual orientação da doutrina e da jurisprudência sobre o alcance ético da separação de fato”. A decisão aplica um dispositivo do Código Civil de 2002 que assegura direito sucessório ao viúvo se não estiver separado há mais de dois anos.
Para a vice-presidente do IBDFAM, a decisão contradiz todos os avanços em termos doutrinário e jurisprudencial sobre os efeitos da separação de fato. “O artigo 1.830 do Código Civil, que serviu de base para esse julgamento, assegura o direito sucessório ao cônjuge sobrevivente, na hipótese de ele estar separado de fato ou separado judicialmente, separação que nem existe mais depois da Emenda Constitucional 66/2010, se houver prova de que quem tornou insuportável a vida em comum foi o falecido.”
“Esse dispositivo que está no Código Civil está absolutamente superado porque há que se lembrar que o código é de 2002. Em 2010, por iniciativa do próprio IBDFAM, a emenda constitucional acabou com o instituto da culpa e com o instituto da separação. Agora, o que põe fim ao casamento é o divórcio”, pontua a especialista.
Maria Berenice explica que, como a lei atribui a possibilidade de que as pessoas separadas de fato construam união estável, isso significa que a separação de fato gera alguma consequência jurídica. “E como a separação de fato leva a cessação dos deveres conjugais e a comunicabilidade do patrimônio isso significa que a separação gera efeitos jurídicos.”
“A orientação do próprio Superior Tribunal de Justiça – STJ é de que a separação de fato põe fim à sociedade conjugal. No mesmo sentido, o Enunciado 2 do IBDFAM reconhece que ‘a separação de fato põe fim ao regime de bens e importa extinção dos deveres entre cônjuges e entre companheiros’. Deste modo, ora, se a separação de fato acaba com o casamento, é absolutamente injustificável que rompido o casamento com a separação de fato, se assegure ao cônjuge sobrevivente ou ex-cônjuge sobrevivente, qualquer direito sucessório”, pondera a advogada.
O que é possível assegurar ao ex-cônjuge sobrevivente, aponta a especialista, é eventual meação de bens que teriam sido adquiridos durante o casamento, até a data da separação de fato. “Mas nesse aspecto, não se está no campo do Direito Sucessório. Meação não é Direito Sucessório.”
“Essa decisão significa um retrocesso injustificável. Agora há que se aguardar o julgamento colegiado, que tenho certeza que irá realinhar e ratificar a orientação que vem sendo adotada de uma maneira muito significativa e reiterada de que, depois da separação de fato, o casamento não gera qualquer efeito, muito menos sucessório”, frisa Maria Berenice.
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM