O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou em recurso o estudo psicossocial em vez da destituição do poder familiar de uma criança em caso envolvendo a chamada “adoção à brasileira”.

Anteriormente, havia sido designada a destituição do poder familiar por causa da entrega de forma irregular do filho para fins de adoção, causa considerada para a perda do poder familiar do pai ou da mãe (CC, art.: 1.638, V), com a vigência da Lei n. 13.509/2017. No entanto, a lei nem sequer estava em vigor quando da prolação da sentença, de modo que não poderia, por si só, causar a desconstituição do poder familiar.

Além disso, de acordo com o § 2º, do art. 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22, com mais razão a configuração da “adoção à brasileira” não poderia constar, ao menos à época dos fatos, entre as hipóteses de destituição do poder familiar.

Assim, a perícia psicossocial é de grande relevância e imprescindibilidade, haja vista que, por se tratar de medida extrema, a perda do poder familiar somente é cabível após esgotadas todas as possibilidades de manutenção da criança no seio da família natural, pressupondo a existência de um procedimento contraditório, no qual deve ser apurado se a medida efetivamente atende o melhor interesse da criança ou do adolescente.

Para Maria Berenice Dias, desembargadora aposentada e vice-presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, “ainda que a motivação do julgamento tenha sido o fato da entrega ter ocorrido antes da vigência do atual código, que prevê como causa da destituição do poder familiar a entrega do filho, o mais relevante e que merece até ser louvado é que não determinou como acontece, infelizmente ainda, a imediata retirada da criança da família que ela conhece, do pai e da mãe com quem ela convive desde que nasceu e reconhece como tal”, disse.

A criança não pode ser penalizada por algo que ela não cometeu, reforça Maria Berenice, lembrando também que se alguém cometeu um erro por irregularidade, foram os pais biológicos que entregaram a criança de forma irregular à Justiça. E também os pais adotivos, que a registraram como se filha fosse, a configurar o que se chama de “adoção à brasileira”.

Outro ponto destacado por Maria Berenice Dias é o Estatuto da Adoção do IBDFAM, que está em votação popular no site do Senado Federal. Para ela, esta decisão vem bem ao encontro do que se prevê no Estatuto da Adoção, que é jamais permitir que uma criança seja retirada do ambiente onde ela está pelo fato de a entrega não ter sido da maneira convencional.

“E esta é exatamente a preocupação maior do Estatuto da Adoção, uma vez que prega nada mais nada menos que a aplicação da Constituição, que concede prioridade absoluta e proteção integral exclusivamente a crianças e adolescentes. Esta proteção integral às claras está presente na manutenção do seu vínculo familiar, do qual ela convive, e independentemente da sua origem”, finaliza.