A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ iniciou na terça-feira (22) a discussão se o cônjuge de uma neta pode substituí-la processualmente em uma investigação de filiação contra o potencial avô. O caso foi suspenso após pedido antecipado de vista, e já conta com um voto pela impossibilidade da substituição.
O caso é o Recurso Especial – REsp 1.868.188, de Goiás. Nele, o cônjuge de uma falecida, que era parte em uma investigação de filiação, busca substituí-la no processo por representar seu espólio e ser seu único herdeiro necessário. Na decisão do Tribunal de Justiça de Goiás – TJGO, foi dado o direito do cônjuge de prosseguir com a ação.
“A pretensão tem natureza personalíssima, de modo que não se pode atribuir ao filho a paternidade que ele não deseja. Contudo, se ele ajuíza a demanda e vem a falecer, seus herdeiros poderão continuá-la, salvo se o processo já estiver extinto, hipótese em que se presume que ele não pretendeu lhe dar continuidade, ou em que haverá trânsito em julgado”, diz a decisão do TJGO. “O apelante se casou no ano de 2009, sob o regime de comunhão parcial de bens, e desta união não advieram filhos. Assim, o único herdeiro da falecida é o aqui apelante”, resumiu o acórdão.
Para a recorrente, uma tia da falecida e inventariante do potencial avô, o herdeiro necessário não poderia suceder a autora da ação de investigação de relação avoenga, cumulada com pedido de herança. O argumento é de que a substituição processual não poderia ter ocorrido, pois está em discussão direito personalíssimo e intransmissível.
“Não fosse esse limite [da intransmissibilidade], todas aquelas ponderações que sempre se fizeram sobre a inconveniência da ação de investigação de relação avoenga estariam presentes sem a proteção deste direito da personalidade”, indicou Samuel Mezzalira, que representou os agravantes em sustentação oral. “E qualquer pessoa, até as pessoas dessa sala teriam legitimidade para investigação de origem comum para encontrar ancestrais famosos e abastados por simples curiosidade, em detrimento desta tão prestigiada e necessária estabilidade das relações familiares.”
A parte recorrida defendeu que a estrutura do Código Civil difere “herdeiros” e “descendência”, e que a jurisprudência da Corte reconhece a tese do direito à ancestralidade – e que a questão não é relevante. “A questão patrimonial é consequência de um direito sucessório”, perorou Ari Ferreira de Queiroz, patrono da parte. “Se todo descendente é considerado sucessor, nem todo sucessor é descendente. O sucessor é um gênero, do qual o descendente é uma espécie, e a legitimidade é dos sucessores, quaisquer que sejam eles, inclusive testamentários e cônjuges e outros se houvesse.”
Em uma decisão de 2019, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva já havia negado o recurso e mantido a decisão do TJGO. Na sessão desta terça-feira, Cueva disse que sua visão sobre o tema mudou após rever uma jurisprudência da ministra Nancy Andrighi, no REsp 807.849, em 2010. “Após a morte da autora, não remanesce interesse jurídico ao cônjuge supérstite na continuidade da ação que versa a respeito de direito personalíssimo e tem o condão de alterar a ordem natural de vocação sucessória e que destoa das regras do sistema sucessório”, concluiu o ministro.
Após seu voto, Nancy Andrighi pediu vista antecipada do caso. O relator prometeu aprofundar seu voto após o voto-vista da ministra.
Por Guilherme Mendes – Repórter em Brasília