O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, nesta quarta-feira (12), o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 888815, que discutiu se o ensino domiciliar (homeschooling) poderia ser considerado meio lícito de cumprimento, pela família, do dever de prover a educação dos filhos. O STF negou provimento ao recurso por maioria de votos. Ficaram vencidos o ministro relator Luís Roberto Barroso e, em parte, o ministro Edson Fachin. O ministro Alexandre de Moraes, que inaugurou a divergência, foi acompanhado pela maioria.

Com repercussão geral reconhecida, o recurso teve origem em mandado de segurança impetrado pelos pais de uma menina, então com 11 anos, contra ato da Secretaria de Educação do Município de Canela (RS), que negou pedido para que ela fosse educada em casa, recomendando sua matrícula na rede regular de ensino. O recurso questiona atos do Juízo da Comarca de Canela e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que consideraram válida a decisão da Secretaria Municipal de Educação.

Quando o julgamento teve início, no último dia 6, o ministro Barroso votou pelo provimento do recurso extraordinário para garantir o direito à educação em casa, respeitados os parâmetros apresentados no voto. Ele explicou que a discussão não está em saber se o ensino domiciliar é melhor ou pior, mas envolve o “respeito às opções e circunstâncias de quem prefere um caminho diferente”. Segundo o relator, as motivações dos pais que optam pelo ensino domiciliar demonstra a preocupação genuína com o desenvolvimento educacional pleno e adequado dos seus filhos. “Nenhum pai ou mãe faz essa opção, que é muito mais trabalhosa, por preguiça ou capricho”, afirmou, considerando haver razões relevantes e legítimas para que essa opção possa ser respeitada pela Constituição.

Na ocasião, o representante da Associação Nacional de Educação Domiciliar (ANED), Gustavo Afonso Sabóia Vieira, afirmou que o homeschooling é uma modalidade que possui inúmeros casos de sucesso. Segundo ele, hoje há no Brasil pelo menos 15 mil alunos sendo educados em casa, um crescimento de 2000% em relação a 2011. Vieira apontou que, de acordo com pesquisa da ANED, 32% dos pais que aderiram a esse modelo estão em busca de uma educação mais personalizada para seus filhos e 23% revelam insatisfação com o ambiente escolar.

Vieira defendeu que esse modelo gera socialização em níveis satisfatórios e aceitáveis, citando estudos dos EUA que mostram, segundo ele, não haver diferenças relevantes no comportamento entre as crianças educadas em casa e aquelas matriculadas na escola.

Representando 20 unidades da federação, o procurador de Mato Grosso do Sul (MS), Ulisses Schwarz Viana, apontou que a Constituição Federal (CF) estabeleceu um modelo educacional cooperativo, com a participação do Estado e da família, lembrando que o artigo 206 prevê que um dos princípios do ensino no País é a permanência na escola.

O parecer da Advocacia Geral da União foi de que não há na Constituição Federal espaço para que o Estado abra mão do seu dever na educação em favor de outro agente que também tem responsabilidade no processo educativo, como a família.

O vice-procurador-geral da República, Luciano Maia, defendeu que o homeschooling não é uma modernidade, mas “uma volta ao passado, ao que se aplicava no início do século quando ainda era difícil ao Estado se organizar e identificar que era um dever dar educação para todos”.

O primeiro ministro a falar hoje (12) foi Alexandre de Moraes que inaugurou a divergência. Para ele, a Constituição Federal não proíbe o ensino domiciliar, porém a prática carece de legislação que a regulamente. O ministro Edson Fachin permitiu o ensino domiciliar e foi além, estabelecendo o prazo de um ano para o Congresso regulamentar o modelo pedagógico.

A ministra Rosa Weber acompanhou a divergência de Moraes e entendeu que a prática não é inconstitucional, mas que não pode ser liberada por não haver lei. Em seguida, o ministro Luiz Fux votou pela inconstitucionalidade do homeschooling. O ministro Ricardo Lewandowisk votou também pela inconstitucionalidade do ensino domiciliar. “Entendo que não há razão para retirar uma criança da escola oficial em decorrência da insatisfação de alguns com a qualidade do ensino. A solução para pretensa deficiência seria dotá-las de mais recursos estatais e capacitar melhor os professores”, disse.

O ministro Gilmar Mendes também acompanhou a divergência do ministro Alexandre de Moraes e negou provimento ao recurso. O ministro Marco Aurélio concluiu no sentido de desprover o recurso e vedar a possibilidade do ensino domiciliar. Último a votar, o ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência pela “dificuldade de ver um direito líquido e certo imediato”, mas não concordou com a inconstitucionalidade desse tipo de ensino.

Barroso ainda expôs que, na sua visão, o homeschooling é uma opção legítima dentro de um regime de liberdade e maioria dos países desenvolvidos no mundo admitem a prática. “A maior parte deste Tribunal entende que a matéria depende da legislação, acho que é um ponto de vista extremamente razoável. Eu considero que se trata de um direito e não considero que omissão legislativa possa frustrar esse direito”, disse.

A ministra Cármen Lúcia finalizou a sessão proclamando o resultado do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 888815 ao qual se negou provimento. “Faço coro com aqueles que divergiram ao afirmar que não tendo um marco normativo específico ainda é tempo de negar provimento ao recurso nos termos do voto do ministro Alexandre de Moares, sem nada a dizer sobre a inconstitucionalidade da educação em casa”, disse a ministra.

 

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STF)