O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) determinou a retificação de registro civil para mudança de nome e gênero – do feminino para o masculino – em favor de transexual, com reflexos inclusive no registro civil da filha e do neto. O colegiado reconheceu que é suficiente a manifestação de vontade afirmando a identidade de gênero. O relator, desembargador Selso de Oliveira, destacou o princípio da dignidade humana.

No caso, o autor afirmou que nasceu do sexo feminino mas, desde os sete anos de idade, percebeu que psicologicamente pertencia ao sexo masculino. Passou, então, a agir como se fosse do sexo masculino e, mais adiante, submeteu-se a mastectomia – cirurgia para remoção da mama. Segundo ele, o desejo de alterar prenome e sexo/gênero no registro civil teve por objetivo regularizar a situação juridicamente e também evitar constrangimentos a que sempre ficou exposto, além de promover as alterações necessárias e seus reflexos nos documentos da filha.

Na decisão de 1º grau, o pedido foi julgado improcedente por ausência de laudo psicológico firmado por profissional capacitado e inexistência de registros fotográficos ou provas testemunhais acostadas aos autos. A 4ª Câmara Civil do TJSC, entretanto, entendeu não existir necessidade de procedimento cirúrgico de transgenitalização, tampouco laudo médico ou psicológico.

STF já se manifestou

Para a advogada e membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Gisele Alessandra Schmidt e Silva, o TJSC não poderia ter decidido de outra forma. “O Supremo Tribunal Federal, na ADI 4275, já se manifestou no sentido de que as pessoas transgêneros brasileiras podem retificar seu prenome e desígnio de gênero simplesmente com a manifestação de sua vontade no cartório, sem laudos psicológicos, psiquiátricos ou de qualquer espécie”, disse.

Para ela, nesse julgamento (ADI 4275), o STF entendeu que as pessoas transgêneros podem retificar seu prenome e gênero no cartório, manifestando sua vontade sem que para isso seja criado qualquer óbice, “tais como laudos, cirurgias ou vidas escrutinadas como acontecia anteriormente à histórica decisão do STF”.

Reflexos da alteração

A advogada esclarece, ainda, que a alteração do registro de nascimento gera consequências. Ela expõe: “Temos que ter em mente que todo direito adquirido gera uma obrigação. Por exemplo, os homens trans que retificam o prenome e gênero devem, obrigatoriamente, se alistar no serviço militar e também perdem a pensão se, por ventura, sejam filhas ou esposas de militares, ao fazerem a transição passam a ter o gênero masculino o que nãos lhes dá o direito de receber a aposentadoria”.

Para ela, portanto, é necessário retificar também os documentos dos familiares, já que a pessoa que retificou prenome e gênero deixa de existir no que concerne ao nome e gênero que lhes foram designados ao nascer. Por outro lado, observa Gisele Alessandra, a medida pode gerar constrangimento aos familiares. “A decisão de retificar os documentos em conformidade com a decisão do STF deve ser extremamente analisada”, diz.