Em junho, celebra-se o Mês do Orgulho LGBTQIA+, pauta cara ao Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Desde sua fundação, o Instituto atua em prol de ações que assegurem o reconhecimento de direitos da comunidade, bem como pela conscientização para o fim do preconceito e da discriminação. Nesse contexto, especialistas do IBDFAM respondem à questão: o que é motivo de orgulho no que diz respeito ao Direito das Famílias e Sucessões?

Para a advogada Chyntia Barcellos, segunda vice-presidente da Comissão Nacional de Direito Homoafetivo do IBDFAM e presidente da Comissão de Direito Homoafetivo do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Goiás – IBDFAM-GO, a possibilidade do casamento, divórcios, constituição e dissolução de uniões estáveis entre pessoas LGBTQIA+ merecem destaque, uma vez que não só impactam a vida dos envolvidos, mas também repercutem social e culturalmente.

“Graças à Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 4.277, à Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADFP 132 e à Resolução 175/2013 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, é possível a celebração do casamento e união estável entre pessoas de qualquer identidade de gênero apesar do preconceito ainda crescente e lastimável”, ela afirma.

“Também é possível que essas pessoas participem das sucessões de companheiros com direitos garantidos e equiparados à pessoa casada sob o regime da comunhão parcial de bens graças aos Recursos Extraordinários – RE 646721 e RE 878694, ambos com repercussão geral reconhecida que declarou inconstitucional o artigo 1.790 do Código Civil – CC”, aponta.

Segundo a especialista, o reconhecimento da união homoafetiva equiparada à união estável vem promovendo mudanças culturais dentro de empresas e organizações no que diz respeito à diversidade, equidade e inclusão, “atendendo especialmente aos objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 das Organizações das Nações Unidas – ONU, em especial o ODS 5 – igualdade de gênero e o ODS 10 – redução das desigualdades”.

Registro civil

Outra conquista recente para a comunidade LGBTQIA+ foi a possibilidade de alteração de nome e gênero de pessoas trans diretamente em cartórios, sem a necessidade de qualquer relatório médico ou comprovação de procedimento cirúrgico para a autodeclaração, previstos pela ADI 4.275-DF e pelo Provimento 73/2018 do CNJ.

“É importante ressaltar a não gratuidade de tal procedimento administrativo. Ainda que ele seja célere, o acesso ainda é limitado. Graças aos mutirões promovidos pelas Defensorias Públicas dos Estados, o direito à retificação do registro civil tem chegado até à população trans em vulnerabilidade socioeconômica”, aponta.

A isso somam-se decisões em que a Justiça permitiu a alteração de nome e gênero para pessoas não binárias.

“Vale lembrar a decisão da Terceira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP que permitiu a alteração do registro civil para incluir a informação de “gênero não especificado ou agênero. Do mesmo modo, também foi pioneira a medida do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS que, por meio de sua Corregedoria de Justiça, editou o Provimento 16/2022, permitindo a inclusão do termo ‘não binário’ mediante requerimento junto ao cartório do estado nos termos do Provimento 73/2018 do CNJ”, afirma.

“A Comissão de Direito Homoafetivo do IBDFAM entende que tal prática deve ser impulsionada em todo o país para que a mudança aconteça, assim como foi com a possibilidade do casamento entre pessoas homossexuais. Após o movimento de várias Comissões do IBDFAM, tribunais de Justiça de todo o país começaram a editar provimentos, o que resultou na Resolução 175/2013 do CNJ”, acrescenta.

Conforme a Constituição

O advogado Paulo Iotti, membro do IBDFAM, concorda que as principais conquistas da comunidade LGBTQIA+ vieram por meio de decisões históricas do Supremo Tribunal Federal – STF e destaca uma menos conhecida: a Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5.971/2018.

“Com ela, o STF reafirmou a decisão de 2011 ao dizer que um ‘estatuto da família’ do Distrito Federal tem que receber interpretação conforme a Constituição para que seja entendido como protegendo também as famílias homoafetivas e não só às heteroafetivas. Nesse caso, a lei falou em proteção da família ‘entre o homem e a mulher’, no que o STF afirmou que esse tipo de redação não proíbe a proteção das famílias homoafetivas, pois a interpretação sistemático-teleológica da Constituição exige sua proteção”, pontua.

Vale lembrar que, em 2020, o STF anulou um decreto legislativo, também do Distrito Federal, que sustava a regulamentação da Lei Distrital antidiscriminação por orientação sexual, ADI 5.740 e ADI 5.744, de autoria do próprio Paulo Iotti.

“A justificativa do decreto legislativo invalidado dizia que o fazia para ‘proteger a família’, algo sem sentido nenhum, mas por unanimidade o STF disse que, pelo contrário, a lei antidiscriminatória em questão protege as famílias – as famílias homoafetivas, sem prejuízo nenhum às famílias heteroafetivas”, afirma.

“Foi mais uma decisão que protege as famílias homoafetivas e, por isso, merece ser celebrada também por isso, embora também o deva no contexto do Direito Antidiscriminatório como um todo, já que se pautou na proibição constitucional de discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais”, acrescenta.

Para o advogado, é importante ressaltar que o Mês do Orgulho LGBTQIA+ “não se refere a se achar melhor que outras pessoas em razão da nossa orientação sexual ou identidade de gênero, mas de não sentirmos a vergonha que a sociedade homotransfóbica quer nos imputar por não sermos cis-hétero”. E pontua: “é o orgulho de ser quem se é”.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM